“Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.” (Mt 5.5)
Esta bem-aventurança está na contra-mão dos
valores do mundo – O mundo rejeita os valores do Reino de Deus. A humanidade
pensa em termos de força, de poderio militar, bélico, econômico, político.
Quanto mais agressivo, mais forte. Esse é o pensamento do mundo. Jesus, porém,
diz que não são os fortes e os arrogantes que são felizes; nem são eles que vão
herdar a terra, mas os mansos. Ser cristão é ser totalmente diferente. Somos
uma nova criatura. Temos um novo nome, uma nova vida, uma nova mente, um novo
Reino.
O pregador frustra as expectativas do seu
povo – Os judeus subjugados pelos romanos desde 63 a.C., esperavam um Messias
político, guerreiro, que implantasse seu Reino pela força. Havia quatro grupos
em Israel: 1) Os fariseus – eram os religiosos conservadores; eles queriam um
Messias milagroso; 2) Os saduceus – eram os liberais; eles queriam um Messias
materialista; 3) Os essênios – eram os místicos que viviam nas cavernas de
Qumran, perto do Mar Morto; eles queriam um Messias monástico; 4) Os zelotes –
eram os ativistas que queriam se insurgir contra Roma; eles queriam um Messias
militar. Os próprios apóstolos pensaram num Reino político (At 1:6). Mas Jesus
veio com outra proposta e o povo disse: Não queremos esse Messias. Fora com
ele. Crucifica-o.
I. O QUE NÃO SIGNIFICA SER MANSO?
1. Ser manso não é um atributo natural
A mansidão não é apenas uma boa índole, uma
pessoa educada socialmente. Não apenas algo externo, convencional, mas uma
atitude interna, uma obra da graça no coração, fruto do Espírito. Spurgeon
dizia que “ser manso não é virtude, é graça”. Ninguém é naturalmente manso. Só
aqueles que reconhecem que nada merecem diante de Deus e choram pelos seus
próprios pecados, podem ser mansos diante de Deus e dos homens.
2. Ser manso não é ser mole ou ficar impassivo diante dos problemas
Ser manso não é ser tímido, covarde, medroso,
fraco, indolente. As pessoas mansas foram profundamente vigorosas e enérgicas.
Elas tiveram coragem para se posicionar com firmeza contra o erro. Elas
enfrentaram açoites, prisões e a própria morte por seus posicionamentos. Os
mártires foram pessoas mansas.
Jesus era manso e humilde de coração, mas ele
usou o chicote para expulsar os vendilhões do templo e teve coragem para morrer
numa cruz, em nosso lugar.
3. Ser manso não significa manter a paz a qualquer preço
Ser manso não é ser conivente, ficar em cima do
muro, tentar agradar a gregos e troianos, ser neutro, viver sem cor, sem sal,
sem sabor, sem opinião própria. Ser manso não é ser passivo, indeciso.
4. Ser manso não é apenas controle emocional externo
Há pessoas que conseguem manter a calma, o
domínio próprio diante de situações adversas, mas não conseguem abrandar as
chamas da alma. São como um vulcão que estão sempre em ebulição por dentro.
Elas não explodem, mas vivem cheias de fogo por dentro. Elas são apenas
aparentemente calmas. Elas mantém as aparências diante dos homens, mas não são
calmas aos olhos de Deus. Elas não falam mal, mas desejam mal. Elas não fazem o
mal, mas alegram-se intimamente com o fracasso dos seus inimigos.
II. O QUE SIGNIFICA SER MANSO?
1. Uma pessoa mansa é submissa à vontade de Deus
Uma pessoa mansa não se rebela contra Deus, nem
murmura. Ela aceita a vontade Deus de bom grado. Ela diz como Jó: “temos
recebido o bem de Deus, porventura, não receberíamos também o mal?”.
Uma pessoa mansa é como Paulo, sabe viver
contente em toda e qualquer situação. Ela dá sempre dando graças a Deus,
sabendo que todas as coisas cooperam para o seu bem.
2. Uma pessoa mansa está debaixo do controle de Deus
O manso é aquele que foi domesticado. A palavra
manso era empregada para descrever um animal domesticado. Um potro selvagem
causa uma destruição. Um potro domado é útil. Uma brisa suave refresca e
alivia. Um furacão mata. O manso morreu para si mesmo. Ele foi domesticado pelo
Espírito. A mansidão é fruto do Espírito. Ele está sob autoridade e sob o
controle. Ele obedece as rédeas.
O manso é aquele que tem a força sob controle.
Ele tem domínio próprio. Mais forte é o que domina o seu espírito do que aquele
que conquista uma cidade.
O manso é aquele que não reinvindica os seus
próprios direitos. Jesus, sendo Deus, não julgou como usurpação o ser igual a
Deus.
O manso é aquele que está disposto a sofrer o
dano. Como Paulo escreveu aos coríntios, numa demanda entre irmãos, ele está
pronto a sofrer o dano em vez de buscar levar vantagem.
3. Uma pessoa mansa reconhece diante dos homens aquilo que ela
reconhece diante de Deus
Não temos nenhuma dificuldade de fazermos uma
oração de confissão e dizer: “Ó Deus, tem misericórdia de mim, porque eu sou um
mísero pecador!”. Nós admitimos isso. Confessamos isso. Mas se alguém vier nos
chamar de pecador, nós logo rechaçamos. Não admitimos ser diante dos homens
aquilo que admitimos ser diante de Deus. Não aceitamos que os homens nos tratem
da mesma maneira que admitimos ser para Deus.
O manso é aquele que não luta para defender sua
própria honra. Aquele que já está no chão não tem medo da queda.
Ilustração: uma mulher mandou uma carta ao
irmão André fazendo-lhe pesadas acusações. Ele chorou e pediu a Deus graça.
Então, sentou e escreveu uma carta: Minha irmã, eu concordo com você. Eu sou
muito pior do que você descreveu. Se você me conhecesse como Deus me conhece,
certamente você teria sido muito mais forte nas suas acusações.
4. Uma pessoa mansa suporta injúrias
Uma pessoa mansa não é facilmente provocada. Um
espírito manso não se inflama facilmente. Davi dá o seu testemunho: “Armam
ciladas contra mim os que tramam tirar-me a vida; os que me procuram fazer o
mal dizem cousas perniciosas e imaginam engano todo o dia. Mas eu, como surdo,
não ouço e, qual mudo, não abro a boca” (Sl 38:12,13).
Há algumas coisas que se opõem à mansidão:
a) Precipitação – Uma pessoa precipitada, que
fala antes de pensar, que age antes de refletir, que se destempera facilmente e
perde o controle emocional não é uma pessoa mansa. Basílio comparava a ira à
embriaguez e Jerônimo dizia que há mais pessoas embriagadas de paixão iracunda
do que de vinho. A ira descontrolada suspende o uso da razão. Muitas pessoas
são frias na expressão da sua fé, mas vivem em estado de ebulição quando se
trata da ira.
b) Maldade – Uma pessoa mansa não faz o mal,
não fala mal nem deseja o mal. A Bíblia diz que aquele que odeia o seu irmão é
assassino (1 Jo 3:15) e quem o chamar de tolo está sujeito ao fogo do inferno
(Mt 5:22).
c) Vingança – A Bíblia proíbe a vingança: “Não
vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira; porque está escrito: A
mim me pertence a vingança; eu é que retribuirei, diz o Senhor”. A vingança é uma
usurpação de uma ação exclusiva de Deus.
d) Falar mal – A Bíblia nos ordena a não falar
mal uns dos outros. O pecado que mais Deus odeia é da língua que semeia
contenda entre os irmãos. Tiago 3 diz a língua tem o poder de dirigir (freio e
leme), o poder de destruir (fogo e veneno). Muitas pessoas não tiram a vida do
próximo, mas destroem sua reputação com a língua. A língua torna-se um mundo de
iniquidade, indomável e incoerente.
5. Uma pessoa mansa perdoa as injúrias
Jesus disse: “E, quando estiverdes orando, se
tendes alguma cousa contra alguém, perdoai, para que vosso Pai celestial vos
perdoe as vossas ofensas” (Mc 11:25). Não adianta orar sem perdoar. Nós
lembramos mais as injúrias do que as benevolências.
Ilustração: Certa mulher foi visitada pelo seu
pastor no leito da morte: “Você está pronta a perdoar o seu inimigo? Ela
respondeu: Eu não vou perdoá-lo, ainda sabendo que por isso, estou indo para o
inferno.”
Jesus é o nosso modelo de homem manso. “Pois
ele, quando ultrajado, não revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia
ameaças, mas entrega-se àquele que julga retamente” (1 Pe 2:23).
Como deve ser o perdão?
a) Real – Deus não mostra o seu perdão para nós
e guarda o nosso pecado para si. Ele apaga os nossos pecados como a névoa e os
lança no mar e deles nunca mais se lembra. Deus perdoa e esquece. Deus perdoa e
não cobra mais. Deus perdoa e nunca mais lança o nosso pecado em nosso rosto. É
assim que devemos perdoar, como Deus perdoa, de todo o coração.
b) Pleno – Deus perdoa todos os nossos pecados.
“Ele perdoa todas as nossas iniquidades” (Sl 103:3). Se você é manso, você
perdoa todas as injúrias. Uma pessoa que não é mansa, perdoa algumas ofensas,
mas retém outras. Isso é apenas um meio perdão, isso não é completo perdão. Se
Deus fizesse isso com você, como você estaria agora?
c) Constante – A Bíblia diz que Deus é rico em
perdoar (Is 55:7). Até quantas vezes devemos perdoar? Até sete vezes? Não, até
setenta vezes sete. Não há cristianismo sem perdão. Se você não perdoa você não
pode adorar, ofertar, orar, ser perdoado. Se você não perdoa você não tem paz,
fica doente, dominado, atormentado. Se você não perdoa o seu irmão, não é
apenas a ele que você está ferindo, mas está ferindo também a Deus. Quem vive
sem mansidão, morre sem misericórdia.
6. Uma pessoa mansa recompensa o mal com o bem
Amar os inimigos, fazer o bem a eles e orar por
eles é a marca de uma pessoa mansa (Mt 5:44). A Bíblia diz que se o nosso
inimigo tiver fome, demos dar ele de comer (Rm 12:20). O apóstolo Pedro diz:
“não pagando mal por mal ou injúria por injúria; antes, pelo contrário,
bendizendo, pois para isto mesmo fostes chamados, a fim de receberdes bênção
por herança” (1 Pe 3:9).
Pagar o mal com o mal é agir como um selvagem.
Pagar o bem com o mal é agir como um demônio. Mas pagar o mal com o bem é agir
como um cristão, como uma pessoa mansa.
Davi dá o seu testemunho: “Pagam-me o mal pelo
bem, o que é desolação para a minha alma. Quanto a mim, porém, estando eles
enfermos, as minhas vestes eram pano de saco; eu afligia a minha alma com jejum
e em oração me reclinava sobre o peito” (Sl 35:12-13).
III. RAZÕES PARA SERMOS MANSOS
1. Nós devemos ser mansos porque Jesus, o nosso supremo modelo foi
manso
Jesus é o homem perfeito. E ele foi manso e
humilde de coração. Quando ele era ultrajado, não revidava com ultraje. As
palavras de seus inimigos foram mais amargas do que o fel que lhe deram na
cruz, mas as palavras de Cristo foram mais doces do que o mel, foram palavras
de perdão e salvação.
Ele orou e chorou pelos seus inimigos. Ele
perdoou os seus inimigos e nos convida: “Aprendei de mim, porque sou manso” (Mt
11:29).
Cristo não nos exorta a aprender com ele a
fazer milagres, a abrir os olhos aos cegos, a levantar os mortos, mas ele nos
exorta a aprendermos com ele a sermos mansos. Se nós não imitarmos sua vida,
não seremos salvos pela sua morte.
2. Nós devemos ser mansos porque os servos de Deus do passado também
foram mansos
a) Abraão – Abraão abriu mão dos seus direitos
e deu a Ló a oportunidade de escolher primeiro. Uma pessoa mansa abre mão, não
briga pelos seus próprios direitos.
b) Moisés – Números 12:3 diz que Moisés foi o
homem mais manso da terra. Quantas injúrias ele sofreu! Quando o povo de Israel
murmurava contra ele, em vez de se irar contra o povo, ele caia de joelhos em
oração pelo povo (Ex 15:24,25). As águas de mara não foram tão amargas como o
espírito do povo, mas Moisés reage não com amargura, mas com oração.
c) Davi – Saul perseguia loucamente a Davi, e
este, algumas vezes, teve a vida de Saul em suas mãos, mas ele não se vingou (1
Sm 26:7,12,23). Simei amaldiçoou Davi e este não permitiu que sua vida fosse
tirada (2 Sm 16:11). Um homem manso não defende sua própria causa, sua própria
reputação.
3. A mansidão é o caminho para derreter e conquistar o coração dos
próprios inimigos
A palavra dura suscita a ira, mas a resposta
branda (mansa), desvia o furor (Pv 15:1).
A brandura de Davi com Saul, derreteu seu coração
mais do que a bravura de Davi (1 Sm 24:16,17).
A mansidão é como ajuntar brasas vivas na
cabeça do seu inimigo. A ira faz um amigo tornar-se inimigo, mas a mansidão,
faz um inimigo tornar-se amigo.
IV. QUAL É O RESULTADO DA MANSIDÃO?
1. Uma profunda e gloriosa felicidade
Jesus diz que os mansos são felizes,
bem-aventurados. A palavra Macarios era usada pelos gregos para descrever a
felicidade dos deuses. É uma felicidade plena, completa, independente das
circunstâncias, baseada num relacionamento íntimo e permanente com o Deus vivo.
2. A herança da terra no tempo
Mesmo sendo estrangeiro na terra (Hb 11:37), os
mansos são aqueles que herdam a terra. Eles comem o melhor dessa terra. O ímpio
tem a posse temporal da terra, mas o manso usufrue as benesses da terra.
Nesse sentido, os mansos já são herdeiros da
terra, na vida presente. Ele é uma pessoa satisfeita. Sente-se contente. Ele
nada tem, mas possui tudo. Paulo diz: “entristecidos, mas sempre alegres;
pobres, mas enriquecendo a muitos; nada tendo, mas possuindo tudo” (2 Co 6:10).
Paulo diz: “Eu aprendi a viver contente em toda e qualquer situação. Eu tudo
posso naquele que me fortalece” (Fp 4:11-13).
O manso é cidadão do céu. O manso é filho de
Deus. O manso é herdeiro de Deus e co-herdeiro com Cristo. Do Senhor é a terra
e a sua plenitude. Tudo que pertence ao Pai, pertence ao filho (1 Co 3:21-23).
Os mansos são os verdadeiros herdeiros de tudo o que é do Pai. Receberemos a
herança original de domínio sobre a terra que Deus deu a Adão. É a reconquista
do paraíso.
Eles conquistam a terra não pelas armas, não
pela força, mas por herança. O manso herda as bênçãos da terra. O ímpio pode
ter abundância de dinheiro, mas o manso tem abundância de paz (Sl 37:11). O
ímpio não tem o que parece ter. Ele tem propriedades, terras, mas não pode
levar nada, não herda nada. Mas o manso, mesmo desprovido agora, tem a herança,
a posse eterna de tudo o que é do Pai.
3. A herança da nova terra e do novo céu na eternidade
O manso desfrutará da terra restaurada,
redimida do seu cativeiro. Ele habitará no novo céu e na nova terra (Ap
21:2-3). Ele reinará com Cristo sobre a terra.
O manso não apenas herda a terra, mas também o
céu. O manso tem a terra apenas como a sua casa de inverno, mas tem no céu uma
mansão permanente, eterna, casa feita não por mãos, eterna no céu.
Rev. Hernandes Dias Lopes